Programa Arroz da Gente: esperança para pequenos agricultores e mais uma sangria para os produtores
- IGOR VIEIRA

- 18 de set.
- 4 min de leitura
Atualizado: há 7 dias

Uma das estratégias da CONAB para uma regulação dos estoques de arroz é considerada como mais um trunfo neste jogo de gato e rato entre governo e produtores: O Programa Arroz da Gente.
Lançado em 2024 é considerado uma estratégia ressucitada pelo governo que chega em um momento bastante delicado para os produtores de arroz. A proposta é ambiciosa: ampliar a produção do grão a partir da agricultura familiar, garantindo não apenas o aumento da oferta de alimento no país, mas também a valorização de comunidades tradicionais, povos indígenas, assentamentos da reforma agrária e pequenos agricultores.
Para além do discurso, o programa promete colocar em prática medidas concretas como crédito com juros reduzidos, apoio técnico, fomento, garantia de comercialização e acesso facilitado a tecnologias adequadas à realidade do agricultor familiar.

Agricultura familiar como solução?
A meta do governo é atender 5 mil famílias em 250 comunidades espalhadas por 17 estados, atravessando biomas tão distintos quanto Cerrado, Semiárido, Amazônia e Mata Atlântica.
Mas aqui cabe uma pergunta prática: qual será o impacto real desse programa sobre o abastecimento interno de arroz?
A produção nacional estimada para 2025/26 é de 11,5 milhões de toneladas, mesmo após a retração de área (de 1,76 para 1,66 milhão de hectares) e a queda de 4,8% na produtividade média(Dados CONAB). Esses números mostram que, mesmo em um cenário de ajustes e custos apertados, são os médios e grandes produtores que seguem garantindo o suprimento do mercado brasileiro.
Nesse contexto, a contribuição de pequenos sistemas de produção familiar, ainda que importante socialmente, dificilmente terá peso significativo na balança da oferta nacional.
Custos altos em escala reduzida
Outro ponto que merece reflexão é o custo de produção.
Grandes produtores, com acesso a escala, tecnologia e logística consolidada, já enfrentam dificuldades em manter margens diante da desvalorização do grão provocada pelo excesso de oferta em 2024/25.
Imaginar que agricultores familiares, em áreas menores, conseguirão enfrentar essa mesma pressão de mercado parece, no mínimo, um desafio subestimado.
Equipamentos adaptados, colheitadeiras pequenas e silos de menor porte são recursos importantes, mas a conta do arroz não se fecha apenas com máquinas.
Fertilizantes, defensivos, energia, transporte e mão de obra são custos que afetam igualmente grandes e pequenos — e, em escala reduzida, tendem a pesar ainda mais. Afora outro calcanhar de aquiles: IRRIGAÇÃO!
Mais arroz no mercado, mais pressão sobre os preços
Há ainda um efeito colateral que não pode ser ignorado: mais arroz no mercado significa maior pressão sobre os preços.
Num momento em que o grão já se encontra desvalorizado, qualquer incremento adicional na oferta tende a puxar a cotação ainda mais para baixo.
É como uma pequena sangria no bolso do produtor — incomoda, aperta as margens, mas não chega a ser fatal.
Para quem já opera no limite dos custos de produção, no entanto, cada centavo a menos na saca pesa.
As entidades fazem sua parte: incentivam a redução de áreas, fomentam a exportação. O IRGA falou na Expointer em isenção da taxa CDO.
Falta de clareza e estudos de impacto
Outro ponto que levanta questionamentos entre os produtores é a ausência de dados concretos que demonstrem como o Arroz da Gente de fato vai contribuir para a segurança alimentar.
O governo fala em diversificação genética, inclusão social e combate à fome, mas até agora não apresentou estudos técnicos robustos que comprovem a efetividade das ações do programa no longo prazo.
Do ponto de vista dos produtores, fica a impressão de que o projeto pode funcionar mais como um instrumento de fortalecimento de vínculos com comunidades do que como uma política agrícola estruturante.
Afinal, não está claro como a produção em pequena escala ajudaria a reduzir os riscos de eventual(e improvável) desabastecimento — especialmente quando o próprio setor produtivo, mesmo em cenário adverso, já garante o volume necessário para o consumo interno.
A visão do campo: boas intenções não bastam
É importante destacar que não se trata de desmerecer a agricultura familiar. Pelo contrário, seu papel cultural e social é inquestionável.
Mas quando o tema é segurança alimentar em escala nacional, a responsabilidade recai sobre quem consegue produzir em grandes volumes, com qualidade e competitividade internacional.
Os produtores, que hoje já convivem com margens mais curtas e retração de área plantada, olham com cautela para um programa que promete soluções simplificadas para uma cadeia produtiva complexa.
Sem clareza sobre metas de impacto, projeções de produção efetiva e estratégias de integração com o mercado, o risco é que o Arroz da Gente acabe sendo mais simbólico do que prático.
Conclusão
O Programa Arroz da Gente pode até cumprir um papel social relevante, ao dar visibilidade a comunidades e apoiar a agricultura de subsistência. Mas, do ponto de vista da sustentação da cadeia orizícola brasileira, a medida parece carecer de realismo e profundidade técnica.
Enquanto os produtores seguem ajustando seus custos, enfrentando o dilema da retração de área e absorvendo as oscilações do mercado global, fica a dúvida: será que iniciativas pontuais, sem estudos sólidos de impacto, conseguem de fato contribuir para o abastecimento nacional?
A resposta, por enquanto, ainda parece distante. O arroz brasileiro seguirá garantido principalmente pela força e resiliência dos grandes produtores. O resto é promessa que precisa mostrar serviço no campo.
Fonte: Ministério do Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar
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